No dia 13 de julho de 2009, Valdenir Benedetti deixou este mundo para viver entre as estrelas, talvez seu ambiente mais familiar. Porém aqui permanece imortalizado pela sua maneira de pensar e ensinar a astrologia. Muito amado por muitos, deixou uma marca indelével em seus alunos e em todos os astrólogos que com ele conviveram e que reconheceram nele um renovador da nossa arte de interpretar os céus. Como acontece a todos os que ousam transgredir, questionar e inovar, também teve lá seus desafetos, faz parte... Por sorte deixou inúmeros textos, alguns publicados outros não. Este blog foi criado para que todo o seu pensamento fosse acessível tanto aos que o conheceram quanto aos que, ao longo de seu aprendizado da Astrologia, com certeza dele ouvirão falar.



"Há pessoas que nos falam e nem escutamos, há pessoas que nos ferem e nem cicatrizes deixam, mas há pessoas que simplesmente aparecem em nossas vidase nos marcam para sempre."

Cecília Meireles







25.6.10

TRANSFORMAÇÃO

“Se um homem pudesse entender todo o horror da vida das pessoas comuns, que estão dando voltas num círculo de interesses insignificantes e insignificantes objetivos, se pudesse entender o que é que elas estão perdendo, compreenderia que só pode haver uma coisa importante para ele – escapar da lei geral, ser livre. O que pode ser importante para um homem que está na prisão e foi condenado à morte? Somente uma coisa: Como salvar-se, como escapar: nada mais é importante."


G. I. Gurdjieff



Quem quer se transformar?

A palavra Transformação, é usada e abusada nos dias de hoje. Terapeutas, astrólogos, até videntes usam essa palavra para designar todas as mudanças ou aparentes mudanças que a pessoa está experimentando ou vai experimentar.

As pessoas se preparam para viver a tal transformação, sofrem revezes, enfrentam dificuldades, até aprendem com isso e no final dizem: “vivi uma imensa transformação”. É possível, bem possível que realmente tenham vivido isso.

Vamos experimentar fazer um inventário das transformações que já experimentamos. O que mudou realmente? Nos tornamos mais serenos? Mudamos de casa, de relacionamento? Adotamos outra profissão, outra postura na vida?

Tudo isso é transformação. Mas na essência, o que realmente se transformou? Será que a partir das transformações que experimentamos estaremos realmente prontos para ver e viver a vida de outra forma? Será que não repetiremos os mesmos scripts nos relacionamentos, ou teremos as mesmas atitudes e reações que tínhamos antes diante dos desafios da vida?

Será que as coisas às quais éramos apegados, hábitos, crenças, sentimentos, objetos, deixaram realmente de ter importância? Ou apenas mudou o nível de nossa relação com essas coisas?

Só estou fazendo perguntas das quais não sei as respostas. Posso falar daquilo que acreditei ser minha transformação. Realmente percebi que mudei muitas coisas. Deixei para trás certos hábitos, aprendi a reagir com mais serenidade diante de algumas pressões da vida. Aprendi a julgar menos, criticar menos, ser mais gentil. Talvez tenha ficado mais ágil e me movimentado melhor quando aparecem os desafios do cotidiano. Tudo isso realmente está acontecendo, mas quando olho de verdade para dentro de mim, não sinto que eu seja outra pessoa, quero dizer, uma pessoa realmente transformada, com outra forma, outra energia de fato.

Ainda estou sujeito a ter reações emocionais quando me sinto ofendido, alias, ainda me ofendo com coisas que mais tarde perceberei serem banais. Ainda tenho raiva, ciúmes, medo de perder, de fracassar, de ser rejeitado, abandonado e outros medos e sentimentos considerados absolutamente humanos.

Então, diante de tudo isso, concluo que não me transformei realmente, pois tudo que me incomodava e me fazia sofrer ainda está presente em minha vida. Que transformação é essa que não liberta a gente daquilo que traz sofrimento? Acho que na verdade só pensei que me transformei.

Diante disso, cheguei a algumas conclusões a respeito de transformação:

1- A transformação não ocorre no ambiente ou nas relações sociais da pessoa, ela é interna, acontece apenas dentro da pessoa. O que ocorre na relação com o mundo exterior é apenas reflexo dessa mudança interior.

2- A transformação é sempre amorosa. Tanto no processo quanto no resultado ocorre um tipo de alquimia. Podemos observar que sempre que tivemos a oportunidade de experimentar um estado amoroso, mudamos interiormente e passamos a interagir de uma forma renovada e plena com o mundo. Transformamos o chumbo de nossos medos no mais luminoso ouro.

3- A repetição inconsciente dos “scripts”, dos padrões familiares e outros é o principal obstáculo para viver uma transformação verdadeira.

4- Quando é denunciada por algum fato a repetição inconsciente dos “scripts”, caímos em um poderoso estado mental e começamos a racionalizar e argumentar imediatamente. Nesse momento o ego toma o poder de nosso ser, e ego é mente.

A ASTROLOGIA E A TRANSFORMAÇÃO

A prática mais comum da astrologia eu costumo chamar de “astrologia descritiva”, e consiste em descrever a personalidade, localizar no mapa os potenciais e qualidades inerentes àquela pessoa.

Todos nós estamos sujeitos a praticar esse tipo de astrologia, é componente básico do trabalho astrológico. As pessoas afinal querem se conhecer, saber algo de si mesmas, compreender o que as motiva e o que atrapalha suas vidas. Algumas até querem saber o futuro, o que vai lhes acontecer, talvez para se prevenirem ou se prepararem para o porvir.

Isso não tem nada a ver com psicologia. Não existe uma “astrologia psicológica”. Todo discurso de alguma forma envolve a psique, as escolhas da psique, inclusive quando se referem ao comportamento, conseqüentemente acaba tudo sendo psicológico. Poderíamos também chamar de “mental” todo esse discurso astrológico. Tanto faz.

O que acontece é que a astrologia descritiva não se presta à transformação. Ela é na verdade um poderoso instrumento de sedimentação de crenças e padrões de comportamento, exatamente porque mantém a pessoa atrelada àquilo que impede sua transformação, a mente ávida que insiste em continuar fazendo um inventário da realidade exterior e se alimentando desse inventário, que passa a ser para ela, a mente, a própria realidade.

Isso é praticamente um contrato, um compromisso com o que acreditamos ser, um compromisso com a manutenção do mundo de acordo com nossa descrição e dentro do qual aprendemos a “nos virar” e sobreviver. Transformar-se significa desconstruir esse mundo externo, essa realidade descrita, desistir realmente de todas as referencias que vem de fora, e a mente comum jamais permitiria isso, talvez por ter “aprendido” que a realidade está fora do indivíduo e não em seu interior.

Mudar o foco da relação do mundo externo para o mundo interior é talvez o primeiro e mais importante passo para que experimentemos uma real transformação. A leitura descritiva do horóscopo normalmente parte da premissa de que a realidade se compõe da relação entre a pessoa e o mundo ao seu redor, feito de acontecimentos, fatos, ações e reações, e portanto não se presta à reorientação da atenção do indivíduo para dentro de si mesmo.

Isso me leva a concluir que a astrologia descritiva é de fato muito boa, maravilhosa. Nos ajuda a compreender nossos papeis, nossos potenciais, auxilia a compreender as outras pessoas e o fluxo e refluxo de energia entre nós, possibilita descobrir vocações e talentos, permite também a superar deficiências e aproveitar o que temos de melhor em nós mesmos, e principalmente, é um poderoso instrumento para nos manter confortáveis e atrelados a acordos milenares do que é certo ou errado, acordos dos quais jamais participamos de fato.

A astrologia, com vem sendo praticada há milênios, como dizem, é uma linguagem de sedimentação e manutenção de crenças.

Tem um detalhe importante, uma constatação à qual cheguei depois de muitos anos de pesquisa, estudo, trabalho, experiência, vivencia:

A astrologia não transforma!

Pelo menos a astrologia que é comumente praticada, aquela que se especializou em descrever personalidades e propor a manutenção confortável do padrão que está ai, que acontece dentro da ilusão da realidade, chamando de transformação o processo de adaptação ou de melhor envolvimento a um modelo exterior ao ser.

Ela não conduz ao gesto definitivo, ao salto no abismo do desconhecido, ao ato corajoso que permitiria nossa verdadeira libertação. Na maioria das vezes a astrologia possibilita um conforto ilusório, um tipo de acomodação nas camadas da realidade às quais estamos acostumados e nas quais fomos condicionados a acreditar.

Isso não invalida a prática da astrologia como tem sido feita, mas sugere que é preciso ousar mais, ir além, tentar obter chaves, instrumentos que nos conectem mais com a verdade contida originalmente em cada um de nós do que com a realidade fora de nós.

A própria astrologia nos permitiu perceber e identificar padrões que alimentamos com nossa mente ávida de descrições e que sustentam a realidade aparente. Quando algum desses padrões é questionado reagimos instantaneamente e com racionalizações e explicações infinitas, na maioria das vezes sem perceber que estamos fazendo isso.

Esses padrões, que chamaremos de crenças, quando denunciados, colocam a pessoa em um tipo de “estado alterado de inconsciência”. Somos quase que possuídos por uma racionalidade obtusa e começamos imediatamente a contar historias, fatos, reflexões que nos conduziram a ser assim, a acreditar naquilo. Quando observamos de fora e criticamente nossa própria conduta defensiva é que percebemos o quanto estamos comprometidos com a descrição emotiva da realidade e nos agarramos desesperadamente a ela.

Podemos tentar descrever (ops!), baseados na própria estrutura do horóscopo, doze tipos, doze padrões, uma dúzia de crenças fundamentais e dolorosas que inclusive corrompem a própria astrologia fazendo com que ela seja apenas mais um instrumento de manutenção dessas crenças.

É bem difícil reconhecer o quanto estamos submetidos a essas crenças, e quando surge algum tipo de constatação ou um confronto que nos leve a perceber nossa submissão a elas, é provável que nossa mente exploda imediatamente em justificativas e explicações ou na pior das hipóteses, na negação do que estamos vendo e constatando como situações possíveis e reais em nossas vidas.

AS CRENÇAS

Seguiremos nessas reflexões a ordem das casas e seus significados padrão, apenas para termos um guia e uma coerência em nossa tentativa de compreender esse mecanismo tão complexo, que inclusive nos coloca muitas vezes em conflito por ousar questiona-lo.

CASA 1 - EXISTE FRACASSO

Essa é uma crença comum e constante, fundamento e motivação do comportamento de grande parte das pessoas. Muito mais que o desejo de sucesso, o medo de fracassar.

Esse medo é tão forte e presente que muitas vezes as pessoas se sujeitam a situações vexatórias, humilhantes, sofridas, apenas para não admitir que “fracassaram” em suas escolhas e projetos, como em casamentos visivelmente falidos ou escolhas profissionais inadequadas.

O medo do fracasso implica na crença que desistir é fracassar, quando sabemos que desistir dentro de condições adequadas e não covardemente antes de qualquer tentativa, é absolutamente natural e saudável, representando o fim de um momento e o ingresso em outro, mas sabemos como é geralmente difícil deixar para traz situações muitas vezes constrangedoras ou de sofrimento.

A crença no fracasso, como todas as crenças, envolve o julgamento e, pior ainda, o julgamento sobre o que o “outro” está julgando.

CASA 2 – A PROSPERIDADE EXIGE SACRIFÍCIO

O dinheiro é difícil, a segurança é complicada e sacrificada, variantes comuns dessa crença e geram situações que praticamente obrigam a pessoa a viver sob tensão, acreditando que o bem estar é conquistado sempre e apenas através de sofrimento.

É normal que o espírito encarnado queira proteger e resguardar seu corpo, viver com algum conforto e segurança. É normal também que a qualidade de vida seja percebida como uma condição para a preservação de si mesmo e da própria espécie. Acontece que, diante da crença que a prosperidade, o dinheiro, a segurança material, exigem sacrifício constante, esforço sobre-humano, a ação e reação do indivíduo diante das situações que envolvam segurança podem se tornar distorcidas e até mesmo obsessivas. É possível que a pessoa contrarie sua própria natureza, se torne mesquinha, possessiva, dinheirista, interesseira e outras qualidades não tão agradáveis de se reconhecer dentro de si mesmo.

A idéia de que a prosperidade é difícil e sacrificada se estende para outras situações além da relação com a matéria e o conforto. Os sentimentos, os relacionamentos amorosos, a amizade, os projetos de vida prazerosos e as atividades que conduzam à evolução pessoal podem ser sentidas como fonte de sofrimento, empecilhos para a estabilidade material, caminhos inseguros.

Também pode ocorrer, a partir dessa crença, que a dificuldade de progresso se entenda a todas as áreas da vida que representem possibilidade de crescimento.

CASA 3 – INFORMAÇÃO E CULTURA É PODER

Essa é uma crença particularmente perniciosa. Alimenta um sistema social perverso e mesquinho no qual a manutenção da informação confere a seu possuidor um tipo de poder de controlar os demais e estabelecer limites e direções para suas vidas.

Talvez a crença de que informação é poder, mantida principalmente pelos “poderosos da mídia”, sustente o estado de coisas conflitantes que se convencionou ser a realidade, seja por exemplo a crença que estabelece um formato social competitivo e ajuda a alimentar todas as outras crenças, como a de que somos um país pobre, ou o mundo é perigoso, ou todo rico deve ter roubado em algum momento, entre outras.

Observemos o noticiário da imprensa, seja escrita ou falada, e notaremos que o que geralmente importa para os donos da informação é alimentar a tristeza, a violência, a pobreza, a ausência de facilidades, a insegurança, etc.

As boas noticias são a exceção.

Interessa, para quem acredita que informação é poder, que as pessoas vivam inseguras, assim seu poder de manipular se perpetua.

O núcleo mais corrupto da política e de qualquer antro de poderosos é mantido apenas porque alguns dispõem de informações as mais esdrúxulas sobre a vida e a intimidade dos demais, e alguns se submetem a isso porque acreditam que podem ser prejudicados por essas informações. E podem mesmo!

Sabem por quê? Porque vivem da mentira. Essa crença é perversa porque ela alimenta a mentira, a falsidade e a corrupção entre as pessoas, simplesmente porque aqueles que vivem com a verdade não tem nada que temer o poder da informação.

E tem mais uma coisa, o ilusório poder da informação não é o poder de ser feliz, de viver plenamente. Ele, esse tipo de “poder”, exige que se viva em “bunkers” para proteger seu tesouro ridículo.

CASA 4 – A FAMÍLIA É A BASE DA EXISTÊNCIA

 família contemporânea é a grande fonte das crenças, de todas as crenças, pois o núcleo familiar é a caldeira onde essas crenças são forjadas e é o veículo que implanta a grande maioria das crenças ainda na primeira infância do indivíduo, durante o período que poderíamos chamar de “domesticação”.

A principal sustentação dessa crença está na ilusão de que a família nos protege. De fato, até o final da adolescência a família tem a função de cuidar e proteger a pessoa, mas a partir daí essa proteção passa a ser perniciosa e apenas alimenta o medo e a desconfiança perante a vida, desconectando o indivíduo de seu próprio poder e da unidade com a própria existência.

É comum que a proteção familiar ocorra através de mecanismos perversos de manipulação, seja de ordem material, energética, emocional, etc., como chantagens emocionais e esse sistema de manutenção da “paz” e da coesão familiar provoca um terrível aprisionamento no indivíduo, especialmente na criança que vai criar o sentimento de que sua própria vida depende dos pais e da família, e esse sentimento torna muito difícil a desidentificação com essa crença, pois está enraizado no mais profundo de seu ser. Nesse caso a família passa a ser a interface ou mesmo o padrão de apequenamento e ruptura interna do indivíduo. A crença de que ele é eternamente dependente de alguma estrutura externa surge daí, e também a crença de que essa estrutura exige dele subserviência em troca da sobrevivência ou do mínimo conforto.

Essa crença tem ramificações curiosas, como a idéia de que definitivamente não podemos viver sem a família, dependemos emocionalmente dela, ou então o propagado conceito de que quem é “de família” tem algum tipo de garantia de ser pessoa idônea, como a gente tanto ouve falar em discursos políticos e outros do gênero. Sabemos todos que isso não é verdade, pois mesmo o maior corrupto tem ou já teve uma família.

A crença na prevalência total da família também a coloca como o último recurso, as únicas pessoas que nos momentos realmente graves de nossas vidas vão nos socorrer provoca um tipo de separatividade e desconfiança de quem não pertence à nossa família, é um poderoso critério de julgamento e escolha. A crença na importância da família chega ao ponto de que mesmo os indivíduos que tem um comportamento anti-social ou são expoentes de mau-caráter (eles também tem família) normalmente são absorvidos e protegidos por seus familiares, e nesse momento, a moral que tanto lutam para preservar é deixada de lado. Se for parente é normalmente perdoado e até justificado seu eventual crime.

Outra conseqüência dessa crença é que os critérios ditados e impostos pela família durante a formação da personalidade do sujeito, passam a ser a base de seu julgamento da realidade. E uma realidade construída por julgamentos que se originam na necessidade e conveniência da manutenção de um modelo, de estrutura rígida e formal como costuma ser o padrão de qualquer família, mesmo as mais saudáveis e menos neuróticas, é uma realidade que também exigirá rigidez, formalidade e segurança, não permitindo jamais que o novo e o diferente se apresente e seja experimentado.

Para a crença de que a família é a principal base da felicidade e da evolução do indivíduo, a idéia de liberdade existe e é aplicada: a liberdade de pertencer ou de não pertencer, e no caso de se escolher não pertencer, o indivíduo terá toda uma sociedade desmoronando sobre ele por não ter aceitado essa crença.

CASA 5 – EU SOU ESPECIAL

É pouco provável que existam duas pessoas exatamente iguais nesse planeta. Cada espírito é único, como um floco de neve. Para se sentir especial é necessário se comparar com alguém, mas como é possível comparar coisas diferentes, seres distintos?

Todos somos de alguma forma especiais, cada ser é especial. O problema de se comparar com alguém também implica em julgamento de valores e qualidades, e esses valores e qualidades pertencem a quem? Foram ditados por quem? Qual o critério real que torna alguém mais especial do que outro alguém?

A demanda de energia para se submeter a essa crença é imensa, exige da pessoa que, a partir da comparação que faz de si mesma com os demais, crie condições, provoque circunstâncias que a diferenciem. O tempo todo, 24 horas por dia e sete dias por semana.

O esforço para ser especial o tempo todo, para se diferenciar dos demais é tão desgastante e ocupa tanto tempo que talvez não dê tempo sequer de respirar adequadamente, quanto mais de amar, viver, ser feliz, etc.

A consideração, o cuidado com o semelhante pode deixar de existir se atrapalhar a condição de “ser especial” que essa crença impõe. E quando a pessoa não se sente bem sucedida no seu esforço de ser especial, exatamente porque ninguém pode ser bem sucedido nessa tarefa irreal, ela pode sucumbir à inveja, do desejo pequeno de que o “outro” deixe de ser “mais especial” do que ela, e até mesmo, nos casos extremos, partir para atitudes distorcidas para prejudicar ou tentar diminuir a importância que sua mente contaminada pela crença vê no “outro”.

CASA 6- O TRABALHO DIGNIFICA O HOMEM

Muitas crenças – talvez a grande maioria – existem para atender uma única necessidade: a manutenção de um sistema social de castas. Servem para alimentar na mente das pessoas a ilusão de que o que estão fazendo é o melhor para elas e que estão atendendo uma necessidade maior.

Essa crença tem um apelo moral, cria a ilusão de que aquele que não tem um trabalho dentro dos modelos aceitáveis pela sociedade é uma pessoa inferior, indigna de merecer a atenção ou o afeto daqueles que são consagrados pela oportunidade de ter algum tipo de atividade socialmente tolerável.

Será que alguém que herdou ou que ganhou em loterias, ou que tenha trabalhado e ganhado o bastante para não precisar mais trabalhar é uma pessoa sem dignidade? Indigna do que seria essa pessoa, de ir para o céu? De receber amor? De ser respeitada pelo que é?

Não há problema em trabalhar. Trabalhar é bom e, na maioria das vezes, necessário. Proporciona conhecimento, experiência, satisfação e sustento, mas não tem nada a ver com esse apelo moral da crença de que o trabalho dignifica o homem.

Em função dessa crença, muitas pessoas se submetem a regimes de trabalho sórdidos, que apequenam e limitam a criatividade, que reduzem o indivíduo a uma maquina de produzir e dar lucro, e a dignidade ai passa a ser apenas uma ilusão a mais para que, mesmo sendo explorado e submetido a alguma eventual condição humilhante, a pessoa encontre a satisfação de pelo menos ser uma pessoa digna. Digna do que?

CASA 7 - EU PRECISO DO OUTRO

Essa é a crença mais complicada de questionar. Afinal nascemos em sociedade, e a convivência é uma contingência da qual normalmente não podemos escapar.

Somos educados e praticamente “formatados” por gente que acredita que é feliz porque tem o “outro” a seu lado.

Alguém consegue pensar na possibilidade de não precisar de alguém a seu lado? Pois é, é difícil isso, mas é uma crença como outra qualquer, um caminho para vivermos iludidos e sempre incompletos, ou seja, completamente distantes de nossa inteireza.

Será que estou dizendo para não nos relacionarmos, nos associarmos, trocarmos energia ou o que for com outra pessoa?

Não!

Estou dizendo que não precisamos realmente do “outro”. Não precisamos de ninguém. Precisar de alguém é uma crença. Achar que estar só é viver em solidão, é sofrer como em uma distorcida canção de amor, é crença. Esperar que alguém precisasse da gente é crença também.

Cada um precisa de si mesmo, cada indivíduo nesse planeta tem que aprender a contar consigo mesmo e em si obter os recursos para seu progresso e evolução. Estamos sós na verdade e cara um pode aprender a ser autor de seu próprio destino em vez de deixar que a ilusão projetada no “outro” seja seu guia.

Por termos sido ensinados a acreditar que a fonte está no “outro”, o amor está no “outro”, estendemos essa crença à idéia de que tudo que é bom está fora de nós, e além dessa crença ser uma fonte de sofrimento, ela é um poderoso mecanismo para nos apequenar e não resgatarmos e conquistarmos nossa verdadeira essência e nosso poder pessoal.

Somos seres divididos por essa crença. Idéias como a da “outra metade da laranja” ou da “alma gêmea” fazem parte dos mecanismos insidiosos que determinam um estado constante de carência afetiva, ou a idéia de que não somos inteiros e, portanto, precisamos sempre de um complemento que está fora de nós para sermos felizes.

Podemos observar duas conseqüências mais evidentes que derivam dessa crença:

A primeira é que, como o fator que determina as escolhas em relação ao “outro” é uma carência, um vazio, o que encontraremos “nele”, por simples ressonância, é seu próprio vazio, suas ausências, o que lhe falta (por pura inconsciência de sua própria inteireza), e nesse encontro multiplicamos nossa incompletude e o sentimento de solidão. O que passa a reger e determinar o relacionamento não é o que transborda, a energia divina que flui através de todos nós, o amor que é a verdadeira fonte de criação da realidade. O que flui é o sentimento de que algo está sempre faltando, exatamente porque fomos iludidos a acreditar que esse algo está fora de nós mesmos, está no “outro”. Esse mecanismo praticamente condena todas as relações regidas por ele ao fracasso, à tristeza, ao desalento que observamos com tanta freqüência nesse mundo em que vivemos.

A segunda conseqüência é que a base de percepção, julgamento e reconhecimento da realidade passam a ser o que não temos, a falta, e isso é uma substância amarga que sedimenta uma realidade ilusória feita da falta em vez da abundância, feita da busca angustiada de algo fora de nós e da negação do muito que existe dentro de nós mesmos.

A possibilidade de se relacionar livres dessa crença existe. Pode acontecer entre pessoas que estão buscando a si mesmas em seu próprio interior e não no outro, pessoas que sabem que estamos sós e na verdade podemos trocar apenas o que somos e jamais o que esperamos que o “outro” seja para nós.

A possibilidade de relacionamento saudável e não comprometido com o vazio e com a carência ocorre entre pessoas que estão no caminho da consciência.

CASA 8 – A MORTE NÃO É PARA MIM

A Morte é para os outros. Ou talvez para quando eu ficar bem velhinho.

Nos é negada a consciência e o reconhecimento que a morte pode acontecer a qualquer instante. Agora, por exemplo, ou daqui a algumas horas.

E com isso vamos nos anulando e adiando a vida para depois. Vamos deixando para experimentar e usufruir da vida em um momento ilusório em que todos os problemas estejam resolvidos, estejamos aposentados ou acomodados em uma situação segura, como se a morte fosse esperar chegar esse momento para todos.

Essa crença é terrível na medida em que sustenta um comportamento estagnado, uma tentativa de acomodação à estrutura que depende sempre da negação do presente, da negação do exato agora.

Acreditar que não vamos morrer, ou que temos muito tempo ainda faz com que o indivíduo adie tanto suas responsabilidades quanto, e principalmente, a alegria, o usufruir do que está vindo.

Acumular compulsivamente bens materiais e se agarrar a eles é conseqüência principalmente dessa crença, como se esses bens nos dessem alguma garantia por representar um compromisso ou um tipo de vínculo com a realidade física. A casa astrológica que simboliza a morte é a casa VIII, sua casa oposta, a II é a que representa a construção material da realidade, os valores, os bens, e na nossa cultura é supervalorizada, de tal forma que é quase que imposto uma relação profunda das pessoas com os significados da casa II e para que isso aconteça é um procedimento comum negar a casa oposta, como se “aquilo” que ela representa não existisse, ou fosse o mal que pudesse impedir a concretização ou a focalização absoluta na casa II.

Se permitir viver por longos períodos situações de sofrimento, em relacionamentos ou em escolhas e situações profissionais incompatíveis com a natureza da pessoa só é possível para quem está submetido à crença de que a morte não vai chegar “tão já”, que é para muito longe.

Claro que não estou falando de comportamentos mórbidos e obsessivos de indivíduos que tem fixação na idéia da morte, tamanho é seu medo de morrer. Aliás, a crença de que a morte não é para nós pode ser vista também como a extensão do medo biológico de morrer, que como sabemos é diferente do instinto de sobrevivência. O medo patológico de morrer só acontece nos seres que tem a primazia do ego, o mesmo não ocorrendo com os animais que supostamente desconhecem que a vida tenha um fim.

Estou falando da crença de que podemos adiar a vida, a felicidade, o prazer para algum remoto momento que pode não chegar jamais. Quem sabe?

CASA 9 – AS LEIS SÃO NECESSÁRIAS/ A MORAL É BOA/ AS CRENÇAS SÃO NECESSÁRIAS

1- As leis não necessárias:

Falaram-me recentemente de uma pesquisa feita por psicólogos a respeito do problema do alcoolismo. Depois de uma série de números e equações sobre a quantidade de alcoólatras em diversos grupos e com diversas motivações, a proposta final dos investigadores foi criar mais centros de tratamento, coibir com mais eficiência a venda de álcool a menores, cercear a propaganda e outras sugestões coercitivas e repressivas.

Esse é um exemplo da reação das pessoas à crença de que as leis são necessárias. Proibir é necessário. Reprimir é uma alternativa válida em nossa sociedade. Isso se origina no modelo educacional de castigo e recompensa. Se a pessoa for obediente e não incomodar os “superiores” será recompensada, se incomodar será castigada.

É evidente que essa crença é poderosa. Todo um sistema jurídico, toda uma estrutura social é sustentada por ela. A manutenção de castas sociais onde uns são privilegiados e outros são massacrados também depende da existência nessa crença.

Sem lei e sem ordem (vinda de cima) não poderíamos viver em sociedade, seria o caos, dizem. E com essa crença cretina vai se alimentando e perpetuando um estado de coisas que exige cada vez mais repressão e cada vez mais transgressão.

De ambos os lados, tanto dos transgressores, quanto dos juristas e das “autoridades” – sejam policiais ou familiares – sua existência depende da crença de que as leis são necessárias e por isso não é possível mais buscar outra alternava. Ambos, repressores e reprimidos estão de acordo e se acomodaram nessa crença e assim vão inconscientemente levando suas vidinhas medíocres e sem maior perspectiva, vivendo do medo de ser punido e punindo todos que não atendem suas expectativas de certo e errado.

E mais uma vez essa crença exige uma condição muito especial de todos: que estejam inconscientes de si mesmos.

Será que uma pessoa consciente, integrada, plena, que sabe que não está separada do universo, que sabe ser uma manifestação do próprio infinito precisa que a corrijam, punam, lhe digam o que é certo ou errado? Ela certamente sabe que na organização maior do universo não existe certo ou errado. Tudo é certo. Tudo tem um papel e uma função.

Ah, mas e a violência, os assaltos, as transgressões de todos os tipos? Se não houver leis vai virar “uma bagunça onde cada um faz o que quer”.

Quem disse que “onde cada um faz o que quer” é uma bagunça? Será que a tal da bagunça não é o lugar onde cada um não faz o que EU quero? Pois é.

Investir na formação consciente das pessoas é uma ameaça para a estrutura de poder que se apresenta na sociedade atual. Muitos que vivem de seu status perderiam talvez a única coisa que tem, seu ilusório poder. Talvez por isso é alimentada essa crença, pelos próprios criadores e mantenedores da lei, como forma de sobrevivência.

O modelo sustentado pela crença de que as leis sociais são necessárias é tão antigo e tão perverso que é bastante difícil imaginar um mundo sem essas leis, um mundo em que apenas a lei natural, as leis biológicas estejam presentes.

2- A Moral é necessária

Quem é que determina o que é moral e o que não é moral?

O processo natural de manutenção da existência biológica às vezes é chamado de moral biológica. É um fato que independe dos nomes que lhe dão.

Entre cada povo do planeta existem conceitos morais completamente diferentes, adequados a cada circunstância local, mas tendo em comum a necessidade de se manter algum padrão de comportamento convencionado entre aquelas pessoas e principalmente, manter as pessoas sob algum tipo de controle.

A necessidade de qualquer tipo de controle sobre as pessoas só pode existir se alguém acha necessário controlar outras pessoas e cria mecanismos para submeter outra a seu poder. Existe também a necessidade de algumas pessoas serem controladas para jamais terem que assumir responsabilidade sobre seus atos.

Em ambos os casos o que prevalece é a inconsciência.

A moral, qualquer moral comportamental, tem a finalidade exclusiva em manter as pessoas inconscientes, tanto de si mesma quanto do universo e da realidade que a envolve.

A crença na necessidade de uma moral sempre implica na moral vindo de fora, estabelecida pela tradição ou por uma conveniência momentânea. Vindo de dentro de nós mesmos só existe o crescimento e a vida propriamente dita, e naturalmente quem é consciente da vida que flui, do privilégio de estar vivo não precisa de nenhuma crença moral. Cada pessoa que é consciente de si mesma sabe exatamente o que fazer. Como estar.

3- Algumas crenças são necessárias.

Alguém me disse: “mas algumas crenças são necessárias”. Fiquei pensando no assunto e tentando imaginar quais crenças seriam necessárias.

Bem, a única crença que achei razoável é a crença em si mesmo. Pareceu-me aceitável. Afinal pelo menos eu preciso acreditar em mim mesmo.

Acontece que em uma análise mais precisa essa crença mostra-se totalmente inadequada como qualquer outra..

A idéia de que acreditar em si mesmo é importante, é difícil viver sem acreditar em si mesmo, mas essa prática nos conduz a um tipo de divisão, àquilo que chamamos separatividade.

Para poder acreditar em mim mesmo eu preciso estar separado de mim. Como se esse “eu” em quem acredito estivesse fora de mim. Eu preciso ser um sujeito que acredita em um objeto, a dualidade torna-se fundamental para que haja essa crença, e acontece que quando me divido, me separo de mim mesmo para poder acreditar, torno-me um ser frágil, sem inteireza, distante da plenitude.

Um ser fragilizado pela divisão, que pode ser comandado, que pode ser mais um alimento energético para a manutenção de uma estrutura ávida, uma estrutura que até mesmo devora seus próprios filhos.

Para se libertar dessa condição é importante pararmos de acreditar em nós mesmos, ou pelo menos questionar essa crença, por mais estranho que isso possa parecer. É fundamental para encontrarmos nossa inteireza, sairmos dessa condição.

É fundamental não confundir a idéia de fé e confiança com o simples “acreditar”. Confiar no universo, tanto quanto confiar no “outro”, é um caminho para ingressar no estado de integração com a totalidade de si mesmo. A fé e sua expressão mais próxima, a confiança, são qualidades espirituais, mais que sentimentos ou compreensões, diferentemente da crença, que é uma experiência puramente mental e emocional, uma expressão do ego.

Se pensarmos bem, acreditar em “nada” é confiar no infinito, é não se submeter à exigências que vem de fora de nós, é aceitar o fluxo da existência como ele se apresenta em cada momento vivido.

CASA 10 – É NECESSÁRIO OCUPAR UM LUGAR NA SOCIEDADE

Se observarmos com distanciamento crítico o que a sociedade oferece ao homem contemporâneo, o estado geral das coisas, como a destruição indiscriminada dos recursos naturais, a promoção da miséria ou da violência, tudo isso para atender o interesse daqueles que não querem perder o seu ilusório lugar de poder na sociedade, perceberemos com clareza que existe uma doença, um desequilíbrio. Isso não é uma crença, é a simples constatação de um fato. Basta despertar um pouquinho e olhar sem apegos e emocionalismos para o mundo em que vivemos. Basta ver o noticiário.

É imensa a quantidade de energia vital que uma pessoa gasta para ser importante, para ser reconhecida, para obter prestígio através de sua performance social, seu trabalho, o que for. Aprendemos desde muito cedo a acreditar que se não formos “alguém” no mundo externo não seremos nada, não receberemos afeto, amor, respeito, nossa vida não terá significado algum.

Essa crença tem suas raízes na casa IV do horóscopo, aquela que representa o passado e a família. É onde aprendemos que é preciso “ser alguém” e que é uma das coisas mais terríveis “não ser ninguém” nesse mundo. É o mais legítimo fracasso, ensinam.

Mas se considerarmos o desequilíbrio social, a falta de qualidade real de vida que existe no mundo externo, a doença que contamina toda a coletividade, o que significa ser importante, obter destaque nesse mundo, aceitar essa crença?

Significa simplesmente ser conivente com a doença e o desequilíbrio.

Significa deixar escorrer nossa energia, gastar nosso tempo, desconectar-se de nosso próprio interior para poder pertencer e ser aceito por essa estrutura cada vez mais falida, cada vez mais doente. E assim, simplesmente alimentamos a grande doença e nos tornamos também doentes.

Quando nos submetemos à crença de que precisamos mesmo ter um “lugar ao sol”, temos que nos desconectar de nós mesmos e dar importância especial ao que está fora de nós. Ser alguém fora de nós é mais importante do que ser alguém dentro de nós mesmos.

Chegamos a acreditar que só receberemos amor se formos alguém na sociedade, só seremos respeitados se tivermos sacrificado nossos sentimentos e nossa conexão com o que temos de mais essencial para obter a atenção dos outros.

Essa crença alimenta os jogos de poder e a manutenção de hierarquias que surgem artificialmente e não por algum tipo de merecimento ou qualidade interna.

Essa crença também nos obriga muitas vezes a sermos duros, a sacrificar o sentimento e a amorosidade em nome da eficiência, tudo para não parecer fraco, não mostrar fragilidades.

Essa crença nos obriga na maioria das vezes a dizer não para nós mesmos e sim para o que está fora de nós.

CASA 11 – CRENÇA NA CARIDADE/ NA NECESSIDADE DE ASSOCIAÇOES

1- A crença na caridade tem duas vias: a de quem faz caridade e a de quem recebe a caridade.

Acreditar que podemos fazer o bem para os outros é uma presunção. Podemos ficar ao lado, chorar e rir juntos, caminhar juntos, mas somente cada um de nós pode fazer o bem para si mesmos.

Não adianta receber benefícios, ser protegido por algum mecenas se não tomarmos atitudes coerentes com nossa própria essência e desenvolvermos a capacidade de fazermos por nós mesmos.

Geralmente o bem que se imagina fazendo por alguém, como tantas instituições fazem, apenas alimenta a dependência e a inconsciência daqueles que recebem, além de, evidentemente, aliviarem a culpa cultural por estar em situação melhor.

A cultura da caridade depende da crença de que existem indivíduos superiores aos outros, mais aptos, mais capazes, e na verdade todos os seres possuem condição, dentro de sua própria natureza, de serem plenos, felizes e conquistarem sua própria autonomia. Porque não teriam?

A crença na necessidade da caridade é uma forma de manter os seres, tanto os que fazem quanto os que recebem, inconscientes de sua tarefa divina, de seu próprio destino. Não podemos aceitar que alguém tenha sido naturalmente condenado à miséria e à inferioridade, é necessária uma estrutura muito complexa, alimentada por uma série de crenças e procedimentos perversos para que se mantenha nesse planeta essa condição antinatural.

Programas públicos para combater a fome e a miséria, por exemplo, jamais vão funcionar enquanto não se resolver a verdadeira causa da miséria: a inconsciência. Só alguém inconsciente pode gerar filhos indiscriminadamente, por exemplo, mesmo sabendo que eles não vão ter o que comer, e mais inconsciente ainda é quem estimula isso, como alguns grupos econômicos e religiosos.

Quem acredita que precisa da caridade dos outros simplesmente não acredita em seu próprio potencial, ou não quer investir energia em seu crescimento.

Ou talvez não possa.

Precisamos considerar os doentes, aqueles que estão em hospitais e instituições. É comoventes ver nos noticiários as pessoas atendendo crianças doentes, cegos e outras pessoas com relativa incapacidade, pessoas que às quais a vida pregou uma peça terrível e dolorosa. Nesse caso, atender e fazer algo por essas pessoas não cremos que possa ser visto como caridade e sim como solidariedade humana, já que eles existem.

A questão é saber, em relação aos que estão em condições precárias de vida e não estão doentes, o que é que os levou a isso, qual o mecanismo perverso que perpetua essa condição de privilégio de alguns e miséria em outros.

Não será a crença na caridade apaziguadora de consciência um agente perenizador dessa condição, pois em vez de se tomar providencias reais para que isso não aconteça, um grupo de caridosos solidários doa um pouco de seu tempo ou seu dinheiro para aliviar um sofrimento que jamais irá terminar enquanto esse mecanismo e essa crença se mantiver.

Receber ou fazer caridade é uma forma de manter-se inconsciente de sua tarefa divina, de seu próprio destino. Ninguém foi naturalmente condenado à miséria e à inferioridade, é necessário uma estrutura muito complexa, alimentada por uma série de crenças e procedimentos perversos para que se mantenha nesse planeta essa condição antinatural.

Somente o ser humano é capaz de submeter seus semelhantes à condições subumanas em nome da crença de que alguns são melhores do que outros, alguns são escolhidos, e esses escolhidos certamente são os que precisam utilizar a caridade para se sentirem integrados ao lugar de seres especiais.

2- A crença na necessidade de “associações” que nos representem é outra cretinice cultural. É um grande facilitador para o indivíduo que não quer ter responsabilidade sobre seus atos. Qualquer erro será absorvido e resolvido pela associação à qual ele está inscrito.

Claro que existe a argumentação de que “precisamos nos unir”, seja em torno de um objetivo comum, seja apenas pela agregação pura e simples para o indivíduo sentir-se amparado por um determinado grupo. Isso pressupõe que somos desunidos e o sentido maior desse “unir” é o de conectar-se ao “outro”, a alguém que está lá fora, que não sou eu. É como se o unir-se aos outros compensasse a desunião interna que muitas vezes vivemos e então tudo ficará bem, tudo dará certo e não nos sentiremos mais sós.

O ser consciente sabe que está naturalmente unido a tudo e a todos, sabe que faz parte de uma totalidade maior, vive e respira isso o tempo todo. Cada pensamento, cada mínimo gesto se integra a um contexto universal, não há desunião, não estamos separados de absolutamente nada nem ninguém, apesar de sermos uma individualidade e em nossa expressão termos particularidades e características funcionais que podem nos destacar dentro de um contexto qualquer.

Um bando de inconscientes unidos vai produzir uma massa energética poderosa de inconsciência, se é que pode existir algo assim. E todos vão se alimentar de suas ilusões e apaziguar a infelicidade que é não ter consciência de si mesmo e de nossos dons divinos. Todos os pecados serão perdoados àqueles que se unem e se solidarizam na própria miséria para se sentirem iguais em sua mediocridade e no fato de cometerem o maior e talvez único pecado real: ser inconsciente e aceitar isso passivamente

A crença nas associações e outra entidades agregadoras tem mantido esse nível de inconsciência e conformidade e ajudado a impedir que cada um conquiste a sua própria totalidade, auto-suficiência e autonomia.

Não há problemas em compartilhar e conviver com pessoas que afinam com nossa vibração e grau de consciência. Essa troca é boa e necessária, e faz com que a gente aprenda e cresça cada vez mais. É natural e orgânica. E também não há problemas em que essa agregação motivada pela consciência que cada um tem de si e do outro, além da busca comum de acessar cada vez mais o plano consciente do ser, se organize e estabeleça alguns procedimentos para funcionar de forma mais adequada. Tudo isso pode acontecer de forma transparente e consciente, motivada pela necessidade natural de trocar energia, conhecimento, afetividade, mas jamais pela necessidade de nos protegermos de algo exterior a nós mesmos, que aquilo que se teme na verdade só pode ser criado pela própria inconsciência do grupo.

CASA 12- TEMOS QUE AGRADAR A DEUS

Agradar a Deus é uma crença das mais difíceis de acessar. Ela envolve algumas crenças persistentes, como a da caridade, a de fazer o bem, a de ser honesto, entre outras.

Todo comportamento atrelado à essa crença é sustentado pela total inconsciência de nosso poder pessoal, de nossa conexão com o universo, de nossa responsabilidade divina de sermos nós mesmos e cumprirmos nosso destino, e isso não é uma crença, é apenas o ato consciente de viver e celebrar a vida em si mesma, exatamente como pode acontecer com uma única célula dentro do universo que é o corpo.

Qualquer coisa que fizermos para agradar a Deus terá que ser feita a partir da idéia de que temos que acreditar em algo que está fora de si (Deus), que pode nos julgar e punir, que determina a qualidade das relações humanas e, principalmente, que não nos dá escolha, já que é uma entidade subjetiva e que depende de uma crença para existir.

E mesmo a conveniente bondade como referencia básica das atitudes de agrado ao “bom” Deus implicam na necessidade de se promover alguma maldade no mundo, da mesma forma que para que alguém seja honesto e agradável a seu Deus é necessário que haja a desonestidade. Uma coisa puxa a outra necessariamente e assim vai se criando essa realidade desconfortável que precisa de todo tipo de crenças para existir e delas se alimenta.

Agradar a Deus é uma maneira de imaginar que nosso espírito está evoluindo a partir dessa conduta. Como podemos conceber que uma atitude inconsciente, motivada por condicionamentos culturais determine algum tipo de crescimento real?

É certo que uma postura verdadeira diante de si mesmo e conseqüentemente diante de tudo que existe pode conduzir a um bem estar e quem sabe a algum tipo de crescimento interior. É provável também que a “reta conduta”, como pregam os budistas conduza o ser a um encontro maior consigo mesmo. Isso envolve atitudes conscientes, pois uma conduta reta e harmoniosa feita porque foi mandado ou ensinado, ou para não ser punido pela divindade que valor pode ter para o crescimento de quem quer que seja?

É evidente que a crença em agradar a Deus é um poderoso instrumento de coerção e controle social destinado especificamente àqueles que não tem consciência de si próprios e de sua divindade, de sermos manifestações puras da natureza. Somos criaturas e cada criatura contém em si mesma o “gen” de seu criador, portanto, é o próprio criador, e agradar e obedecer esse Criador é pura e simplesmente obedecer a si próprio, saber de si, conectar-se consigo.

A necessidade de se acreditar em Deus deixa de existir no momento em que estivermos conscientes de sermos partes da totalidade do universo, de sermos um com todas as coisas que existem, saibamos ou não delas. A necessidade de acreditar em Deus, e principalmente de agradá-lo não pode existir para o ser consciente.

As coisas simplesmente são. A vida simplesmente é.

UM MECANISMO PERVERSO

Iniciamos esse trabalho falando em transformação e astrologia, e podemos perceber com mais clareza, ao analisarmos algumas crenças, o quanto a astrologia pode ser um instrumento de reforço na sedimentação dessas crenças.

O astrólogo comum procura atender a expectativa do cliente em relação a suas dúvidas, e a astrologia se presta em alto nível para oferecer respostas inteligentes e profundas para inúmeras dúvidas existenciais.

Acontece que, normalmente, o astrólogo está comprometido com uma série de crenças. Ele acredita em fazer sucesso, ele acredita que o relacionamento é uma necessidade, pois em geral ele também sente essa necessidade; acredita também nas dificuldades e “quadraturas” da vida. É provável que o astrólogo acredite que a família é a base do crescimento pessoal e sua segurança maior, que é necessário ocupar um lugar nessa sociedade e que a morte é algo previsível e talvez para muito longe, bem como na importância de andar de acordo com as leis morais e sociais e pertencer a algum clube ou sociedade. Talvez o astrólogo até mesmo acredite que é importante “andar direito” para agradar a seu Deus.

Afinal, o astrólogo também é um ser humano!

E foi educado e condicionado para acreditar em todas essas coisas. Quer viver em paz. Não deseja hostilizar a sociedade para não ser tolamente pressionado. Quer ganhar seu dinheiro e ir levando sua vida o mais sossegadamente possível.

Para que mexer ou comprar alguma briga com esse mundo perfeito que está ai. Afinal, as coisas sempre foram assim...

Eu não estou falando de ninguém em particular. Talvez esteja até falando de mim mesmo e do que é que tenho que trabalhar em meu ser. Creio que as observações acima são comuns, não apresentam nenhuma novidade, nem chocam e nem devem ser polemicas.

Exatamente por sermos assim, por aceitarmos simplesmente o estado de coisas como é, sem questionar, é que o mundo está doente. E continuará assim enquanto estivermos dormindo e aceitando como sonâmbulos a doença social como uma coisa normal com a qual temos que simplesmente aprender a conviver.

O QUE A ASTROLOGIA PODE FAZER?

Nada!

Em princípio a astrologia nada pode fazer, pois se trata apenas de uma linguagem, um instrumento de compreensão, e, portanto, ela poderá servir para alimentar e manter o estado de inconsciência geral, como também pode ser uma luz que propicie um despertar. Mas para isso será necessário mudar toda a nossa postura, daquele que estuda e interpreta um horóscopo, antes de poder fazer um uso mais revolucionário da astrologia.

Primeiro será necessário despertar.

Será fundamental nos libertarmos das crenças e começarmos a confiar verdadeiramente no que está dentro de nós, na manifestação de nossa própria essência, pois tudo está perfeitamente integrado no universo e nada acontece que não tenha um sentido cósmico, nem ao menos uma folha que cai de uma árvore é um acontecimento isolado e sem conexão com o todo. Isso significa que as crenças não são necessárias quando estamos lidando com o fato em si da existência, com o fluxo e a harmonia da vida em si mesma.

As crenças existem para atender a necessidade de explicação e justificativa para nossa falta de consciência ou conexão com a lei natural. Existem para que nos sintamos de alguma forma coerentes com o ego e com a descrição que fazemos do mundo, e que precisamos fazer e refazer a cada instante para nos sentirmos integrados ao que convencionamos chamar realidade.

Se experimentarmos olhar o mapa dentro dessa ótica, ou seja, nos propondo a fazer algo para nos livrarmos das crenças e acordar, ao invés de simplesmente ficarmos reforçando padrões através da descrição das configurações, talvez consigamos encontrar outro caminho, o da transformação e da conseqüente libertação dessas crenças todas.

Quando nos propomos a revelar qualidades da personalidade através do horóscopo, mesmo que com o intuito positivo de trazer esclarecimento e mostrar potencialidades que precisam ser ativadas, estamos sujeitos a nos projetarmos e deixar que nosso discurso seja totalmente marcado por nossas crenças. Isso não é bom ou ruim, apenas acontece assim, e reconhecer isso já é um grande passo para talvez nos libertarmos desse procedimento, ou talvez encontrar outro caminho, outra forma de fazer o horóscopo funcionar em direção ao despertar da consciência em vez de apenas reforçar os padrões inconscientes.

Podemos refletir a respeito dos signos, por exemplo, procurando outra ótica diferente da descrição das suas características, tão esclarecedora que as vezes causa até arrepios.

Vamos experimentar ver os signos sob um prisma de procedimentos que contradigam ou nos conduzam a um questionamento das crenças. Esta claro que isso é um procedimento experimental e a tendência de nosso ego mantenedor de padrões é criticar e julgar sempre porque elementos de nosso ser querem manter a segurança de viver sempre de acordo com nossas descrições padronizadas da realidade, aquelas que nos foram implantadas em algum momento de nossa história e à qual estamos acostumados.

De certa forma a idéia de romper com padrões descritivos passa pelo procedimento de abandonar a própria história, parar de se apoiar inteiramente nela. Isso é a base para deixarmos de lado as descrições que alimentam as crenças e ao mesmo tempo pararmos de julgar, pois todos os julgamentos que podemos fazer precisam se basear no já vivido, no já aprendido, naquilo que já foi incorporado por nossa mente e acreditamos que faz parte de nosso ser tanto quanto o sangue faz parte de nosso corpo.

Só nos libertando verdadeira e conscientemente desses padrões poderemos experimentar uma verdadeira transformação.

Trabalharemos com os conceitos do que os signos representam coletivamente, mais do que no horóscopo pessoal, as condições ou o possível significado coletivo desses símbolos é a consideração que será feita a partir de agora. Como símbolos, os signos se aplicam a todas as pessoas, a todas as experiências possíveis, essa é a idéia, e por isso chamaremos de “fator” os elementos abordados de cada signo.

PROCEDIMENTOS POSSÍVEIS

ARIES

Esse fator é o que determina na coletividade todos os processos de iniciação, todos os começos, todos os princípios. De alguma forma, sempre que começamos algo novo em nossas vidas estamos conectados a o fator Áries.

A força da crença de que existe fracasso faz com que a energia pessoal, representada por esse fator, seja canalizada para a competição e para executar movimentos que impliquem em disputa irracional, com medo de sermos de alguma forma derrotados. Aprendemos a acreditar que quem for sempre o primeiro no “grid de largada” não ficará para traz, e raramente nos perguntamos de que coisas poderiam ficar para traz.

Isso é uma redução do significado transpessoal do signo aplicado à nossa realidade mental.

Acreditamos que, em vez de simplesmente reforçar a competitividade simbolizada por esse signo, que é verdadeira dentro do padrão de realidade que vivemos, é possível entender que iniciar algo não representa ter que corresponder à crença de que não se pode fracassar e portanto ser vitorioso a todo instante.

Não há vitória como não há fracasso. Como fazer a nossa parte ariana entender isso?

Existe um meio, que na verdade se aplica a todas as crenças, todos os signos, todas as casas e é a base creio eu do que pode ser feito:

Não Julgar!

Para nos sentirmos inferiorizados ou fracassados em qualquer circunstância é necessário que busquemos fora de nós os referenciais da vitória, e esses referenciais serão identificados a partir de um julgamento com base em nossa historia pessoal e em nossa possível descrição da realidade, aquela que foi aprendida.

É um problema de memória seletiva.

Em uma dimensão humana e psicológica, Áries representa a competição, a iniciativa, o fogo original.

Se procurarmos nos desvincular do compromisso com a realidade aparente, Áries simplesmente vai significar o fazer. Estar fazendo.

Dentro da sintaxe de nossa cultura, tudo tem começo meio e fim. Talvez dentro de outra sintaxe possível, como propõe Carlos Castañeda, tudo é um “continuum”, não existe começo, meio ou fim das coisas, tudo está em processo, então, como experimentar o “iniciar” algo se estamos em um circulo sem fim de eventos?

Creio que o indivíduo que estiver conectado a seu próprio centro, e que se sabe centro de sua própria realidade, sabe que não existe essa hierarquia de começo, meio e fim, como cremos que os animais e seres não contaminados pela mente também sabem.

Isso nos leva a uma proposta de experiência que talvez seja pouco ortodoxa no contexto astrológico, mas que acreditamos mesmo ser a única resposta possível para sair desse envolvimento com as crenças: desconectar-se da mente, sair da descrição, entrar em um estado de sintonia total com toda a criação, e isso só é possível através da meditação, que é o que vai tornar possível esse encontro pleno do indivíduo consigo mesmo e conseqüentemente com toda a sua realidade de forma não mental ou não descritiva.

Libertar-se da crença de que existe fracasso (ou existe vitória), perceber que fracassar é uma ilusão, uma peça que o ego nos prega para nos manter vinculados a um habito e uma crença, pode acontecer sim.

Quando compreendemos que não estamos atrás de ninguém na fila da existência, e nem na frente, e nem em lugar nenhum, perde o sentido totalmente se incomodar com o fracasso e todos os julgamentos, nossos e dos outros, referentes a isso.

Para que ocorra a meditação, dentro dessa proposta de se libertar e se transformar, o primeiro passo é interromper o julgamento, e vinculados à mente descritiva jamais conseguiríamos fazer isso.

Mesmo quando estamos centrados, nos sentindo parte do todo, nos sentindo plenos, absolutos, seja por qual motivo for, no instante em que paramos para “pensar” onde estamos, o que estão pensando de nós, se estou fazendo do jeito certo ou errado, ou qualquer outro tipo de julgamento, instantaneamente voltamos, na verdade caímos em nossa realidade medíocre e habitual.

TOURO

A crença de que a prosperidade exige sacrifício tem relação direta com o fator Touro na natureza.

O signo da forma e da constituição física da realidade, quando experimentado e traduzido no nível do ego e da matéria física na qual vivemos, nos remete à constituição de uma realidade material pessoal, o que também pode ser percebido como bens, valores, tudo que podemos possuir de alguma forma.

Infelizmente Valdenir não terminou este artigo...

Valdenir Benedetti
2003

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